O advento da LC 194/2022 e a incidência do ICMS sobre a TUST e TUSD na conta de energia elétrica

Arthur Sandro Golombieski Ferreira[1]

Há muitos anos se discute no Poder Judiciário a (i)legalidade da inclusão da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) na base de cálculo do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias (ICMS) incidente sobre a comercialização de energia elétrica.

Inclusive, em razão das milhares de demandas que possuem tal objeto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 15/12/2017, submeteu o julgamento dos Recursos Especiais n.os 1.692.023, 1.699.851 e 1.163.020 (que tratam da matéria), à sistemática dos Recursos Repetitivos, cujo tema foi cadastrado sob o n.º 986 perante a Corte e ainda pende de decisão.

Paralelamente a isto, também estava em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF) a constitucionalidade da fixação de alíquota de ICMS sobre as operações com combustíveis, energia elétrica e comunicações, em percentual superior ao utilizado nas comercializações gerais, considerando a essencialidade destes bens para a sociedade.

Com relação a este último assunto, a Excelsa Corte recentemente analisou a questão (ADIs n.os 7117 e 7123), definindo que a alíquota sobre essas transações realmente não pode ser maior do que a aplicada às demais atividades que atraem a incidência do imposto estadual (sessão finalizada em 24/06/2022). O Estado do Paraná, por exemplo, cobrava 29% de ICMS sobre a comercialização de energia elétrica, de tal forma que deve reduzir a tributação para 18%, o que corresponde à alíquota “geral” adotada para outras transações.

O Governo Federal – atento a esse acórdão do Supremo Tribunal Federal e a relevante controvérsia sobre a TUST e a TUSD no STJ – publicou, em 23/06/2022, a Lei Complementar n.º 194/2022, a qual alterou, entre outras normas, a Lei Kandir (LC n.º 87/1996), para expressamente incluir dispositivos vedando a tributação do ICMS sobre essas operações em alíquota superior àquelas incidentes sobre as comercializações em geral, bem como definiu que o imposto estadual não incide sobre as referidas tarifas de transmissão e distribuição:

Art. 3º O imposto não incide sobre:

(…)
X – serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica. (Incluído pela Lei Complementar nº 194, de 2022)

Art. 32-A. As operações relativas aos combustíveis, ao gás natural, à energia elétrica, às comunicações e ao transporte coletivo, para fins de incidência de imposto de que trata esta Lei Complementar, são consideradas operações de bens e serviços essenciais e indispensáveis, que não podem ser tratados como supérfluos. (Incluído pela Lei Complementar nº 194, de 2022)

§1º Para efeito do disposto neste artigo: (Incluído pela Lei Complementar nº 194, de 2022)

I – é vedada a fixação de alíquotas sobre as operações referidas no caput deste artigo em patamar superior ao das operações em geral, considerada a essencialidade dos bens e serviços; (Incluído pela Lei Complementar nº 194, de 2022) (Grifou-se).

Logo, essa inovação legislativa, além de respeitar a jurisprudência do STF, também pacificou, a nosso entender, uma importante discussão jurídica que há anos perdura no Poder Judiciário relacionada à TUST e TUSD (ao menos para o futuro), gerando segurança jurídica ao contribuinte. Resta ao STJ, tão somente, debater a legalidade da inclusão das tarifas até a data da publicação
da lei.

Ocorre que, nada obstante a pacificação do assunto com o advento da Lei Complementar n.º 194, foi constatado que apenas dois estados brasileiros publicaram normas afastando a incidência do ICMS sobre a TUST e a TUSD na conta de energia elétrica: Espírito Santo e Santa Catarina[2].

O Estado do Paraná, inclusive, anunciou, em 1º de julho do correnteano, a redução da alíquota do mencionado imposto sobre a comercialização de energia, combustível e comunicação, mas deixou de tecer comentários acerca deste segundo tema das tarifas.
De qualquer forma, apesar da competência tributária referente ao ICMS ser estadual (artigo 155, II, da Constituição Federal), entende-se que a lei complementar publicada pela União, por si só, já tem o condão de ser aplicada imediatamente sem a necessidade de nenhum outro complemento, pois, nos termos do artigo 146, III, “a”, da CF, compete a LC definir a base de cálculo dos tributos.

Assim, estabelecendo-se que a TUST e a TUSD não compõem a base do ICMS, os Estados não mais estão permitidos a incluir referidas rubricas no cálculo do imposto, independentemente de regulamentação no âmbito de sua esfera.


[1] Graduado em Direito pela Faculdade de Direito Curitiba.

Graduando em Ciência Contábeis pela FIPECAFI.

Especialista em Direito Tributário pela PUC/PR.

Advogado do Setor de Direito Tributário na Advocacia Felippe e Isfer. a.ferreira@afi.adv.br.

[2] Fonte: https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/estados-reduzem-aliquotas-mas-sao-omissos-sobre-exclusao-da-tust-e-tusd-do-icms-13072022

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